quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Enforcado


     Acorda assustado respirando ofegante, vindo de uma vertigem sem fim, nem começo. Entristecido por não ter aguentado não respirar.
     Age desordenado e enquanto sua vida o sufoca ele aperta a lamina. Corta com força desajeitada as veias que latejam ainda que sem vida. Por mais que acreditasse ser o suficiente o sangue mal escorria.
     Sentindo-se escarniado em revolta absurda de uma morbidez sem volta, ele escala o arvoredo. Se debate parado em instantes de absoluto silencio, pode sentir o eco da escuridão ao redor. Quando passa a corda pelo pescoço sente a ira e sorri, demasiado de cansaço mas tentando revidar sua miséria. Foram várias as vezes que aquela situação ocorreu em seus pensamentos. Já não é por sentido, motivo ou razão. De todo o jogo era apenas o próximo passo. Se a roda ainda gira, não faz importância.
     Ainda fica calado enquanto seu copo balança esticado na corda firme. Observa sem choro, sem medo, sem contento. Entra num estado eufórico de desespero e tenta sem desejar tirar a corda do pescoço, mas não tem como. Seu mais simples e puro dos desejos era abraçar a morte com um sorriso no rosto. Para dar uma última vez ali o sorriso morto que sempre teve que esticar no rosto e não partiu com medo da morte, mas sem desejo de morrer.

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